Gordo de Raiz

Parada do orgulho gordo

Crônica originalmente publicada em 7 de junho de 2010 no Papo de Gordo.

– Marcão! Marcão!
– Credo, Cléber, você tá todo esbaforido. Senta aí no sofá e pega uns salgadinhos pra tomar fôlego.
– Sim… Ufa… É que eu estava na internet e li sobre a Parada do Orgulho Gay! Aí tive uma ideia que tinha que compartilhar contigo!
– Er… Bom, cara, a gente é amigo e eu… bem… te apoio em qualquer decisão sua. Bem que eu desconfiava mesmo…
– Do que você tá falando, mané?
– De você querer virar uma bicha gorda, oras.
– Ei! Não é nada disso! E, mesmo se fosse, é preconceituoso falar desse jeito!
– Ficou com medinho de assumir, é?
– Para de palhaçada. Eu estou falando de uma ideia pra divulgar nosso clube!
– Clube, não! Associação dos Gordos de Raiz! Criamos essa instituição para defendermos o direito dos gordos perante a sociedade! É muito mais que um reles clube!
– Tá… Mas ao invés de brigarmos por maiores cadeiras no transporte público ou uma legislação antipreconceito, a gente fica só jogando sinuca…
– Ei! Eu fico batalhando por isso tudo, sim!
– Escrever piadas de magros no Twitter não conta.
– Mas, diz aí, qual a sua ideia, afinal?
– É o seguinte: A Parada do Orgulho Gordo!
– E…
– Como “e…”? A gente podia criar a Parada do Orgulho Gordo! Convocar os gordinhos do Brasil todo para desfilar na avenida Paulista, com carros alegóricos, celebridades gordas e tudo o mais!
– Avenida Paulista… Ela é muito comprida. Metade do povo ia morrer do coração no meio do caminho e o resto ia desmaiar pouco depois. Aí, o orgulho ia pro saco.
– Hmmm… Podemos fazer a parada em um trecho menor… Talvez com um show lá pelo meio da avenida pra justificar…
– Um show vazio porque o público ia correr para as lanchonetes lá de perto ao invés de ficar de pé embaixo do Sol.
– Você está generalizando…
– Estou? Então me responde: Se você estivesse em pé, suando que nem um porco depois de ter caminhado vários quilômetros num calor ferrado e ainda esmagado no meio de uma porção de gordos na mesma situação, o que você faria?
– Eu… Bem… Tá bom, tá bom. Ia correr pro primeiro ar condicionado que encontrasse.
– Viu?
– Mas é só marcar para a noite… Ou no inverno! Taí! São Paulo fica bem fria no inverno e ninguém ia suar tanto!
– E a imprensa?
– Como assim?
– Um evento desses só atinge seu objetivo se a imprensa comparecer.
– Claro que a imprensa vai aparecer.
– Marcão… Não seja ingênuo. A imprensa não valoriza os movimentos antipreconceito. Tirando eventos já consagrados, tipo o próprio Orgulho Gay, ela só aparece em dois casos: Mulher gostosa com pouca roupa ou bizarrice!
– Mas tem muita gordinha gostosa!
– Sim. Mas você quer fazer no inverno, aí elas vão ficar com muita roupa. O ideal seria que elas mostrassem decotões generosos.
– Que coisa machista!
– Estou sendo realista. Sem gostosas de pouca roupa sobra o bizarro. E o que você acha que a imprensa vai falar de um bando de gordo andando ofegante na avenida Paulista à noite com churros e pipocas comprados nas centenas de barraquinhas que vão aparecer por lá?
– Você é muito pessimista! E preconceituoso! Quem disse que os gordos vão estar carregando comida?
– O que tem no seu bolso?
– Er… Umas barrinhas de cereal… pra matar a fome… no caminho da minha casa até aqui… mas… Tá, desisto.
– Onde você vai?
– Vou entrar no Twitter para contar piadas de magros…
– Agora, sim! Uma batalha sólida por nossa causa! Estou orgulhoso!

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